quarta-feira, 24 de junho de 2015

Review: Gotham - Primeira Temporada


Continuando os reviews sobre os seriados atuais da DC Comics, vamos prosseguir com a grande sensação desde seu anuncio, o famoso "série do Batman sem o Batman", trazendo o personagem de volta aos seriados live action 11 anos apos 'Birds of Prey' e quase 50 anos apos o 'Batman' de Adam West. O que de bom a serie traz, e o que ele acrescenta ao cânone do personagem? Vejamos abaixo:

1) Um bravo novo mundo

Gotham já começa se distinguindo de todas as interpretações anteriores do Batman em live action fazendo algo que, em outras mãos menos competentes, poderia ter sido um desastre: Gotham não tenta ter o estilo do Nolan, e muito menos tem interesse nisso, ela abraça tanto o que o diretor fez quanto o seriado da década de 60 fez, quanto qualquer outra interpretação dele não importando a mídia (até mesmo os quadrinhos). Seu objetivo (atingido, em minha opinião) é numa interpretação visual que tenha não só o impacto e identidades visuais bem distintas como você acredite que aquilo que poderia ser uma cidade real como qualquer outra. E isso influência diretamente no jeito que a história é contada e como seus personagens são moldados, as vezes aparentemente em esterótipos que acabam evoluindo em coisas muito mais completas. No geral acaba soando único e especial por abraçar o que foi feito de bom no passado e unir com que está sendo bem feito atualmente.


2) Um Jogo de Tronos

Se lembra daquilo que falei sobre Gotham ser "série do Batman sem o Batman"? Eu discordo fortemente disso, e a série acabou mostrando que estava planejando ir além da noção de ser uma série do Batman partindo do fato conhecido por todo Batmaníaco que a cidade em si é um personagem, e o jeito em que aquela sociedade se comporta afeta diretamente seus principais moradores. Se, em como toda série, eles demoraram um tempo até encontrar o jeito certo de contar a história que queria, a partir do episódio S01 E07 'Penguin's Umbrella', foi esclarecido e atingido o real objetivo: 'Gotham' é o Game of Thrones do Batman, onde todos os principais jogadores lutam pelo poder e pela alma da cidade. Porém a cidade está num momento do qual não necessariamente identificamos como a conhecemos, e como essa luta pela constrói o cenário onde a figura do Batman é necessária. Com certeza sabemos qual lado vai vencer, e qual vai ser o mecanismo de defesa que a cidade vai fazer surgir, e isso nos leva a...


3) Não e sobre o objetivo, e sim sobre a jornada

Conhece essa clássica canção do Motorhead? Então, uma das grandes (senão a principal) diversão de assistir a série é sobre exatamente sobre ela ser uma adaptação, e como adaptação, poder ir por caminhos diferentes ou explorar com mais aprofundamento certos detalhes do cânone. Afinal, a série está lidando com a liberdade criativa e com o correto direito de escrever o que quiser, respeitando os fãs que acompanham o show mas também pensando naqueles que nunca leu quadrinhos na vida. E se você pensa que isso é ruim, está com um pensamento completamente retrógrado: adaptações, quando feitos de maneira boa como esta, servem para exatamente olhar o material original sobre outro olhar e ver o que pode surgir a partir daí que ajuda a acrescentar algo ao original, como muitas coisas que a série fez e pode fazer no futuro.


Mas indo além disso, já ouvi acusações de que a série uma hora "não teria mais histórias pra contar em um certo ponto" devido ao fato de suas possíveis limitações como um prequel, mas como a segunda metade desta temporada bem mostrou, os conflitos na cidade (assim como seria na vida real) não vão se resolver em um ano, ou em um dia. São lutas que vão se alongar pelos anos a vir, focando nas voltas e reviravoltas que as sementes aqui plantadas certamente vão causar.

4) O que faz uma sociedade precisar de um Batman?

Uma das grandes questões da série e um de seus melhores atributos é exatamente explorar paralelamente a construção do Batman sem necessariamente dar foco direto e total ao Bruce Wayne. Para entendermos porque se há a necessidade de um Batman, precisamos ver qual cenário isto é levado. E isso na série, é visto pelos olhos do jovem James Gordon, que ao longo da trama é sentida a evolução não só do status quo da cidade, como o papel que ele mesmo acabou buscando pra si no final das contas para tentar conter não só o caos mas a natureza da criminalidade da cidade que estava mudando drasticamente.


Gotham, como cidade, sempre foi corrupta, sempre teve graves diferenças sociais, e a medida que a megalópole ficava maior, os problemas também ficaram. E com a morte dos Wayne (mais sobre isso a frente), o que resta de decente na cidade foi-se embora, abrindo a oportunidade para a loucura se instaurar e o crime ali evoluir para outra coisa. A cidade tem consciência que está doente e vai chegar um ponto que nem os esforços da policia (e de Gordon), vão ser suficientes. E a resposta para isso?

5) Um Batman em progresso

O processo que leva Bruce Wayne a se tornar o Batman é feito aqui de maneira bastante interessante em relação a qualquer outra origem do personagem, apesar de manter certos elementos corretos e essenciais de sua origem. vemos Bruce Wayne, ainda jovem e com sua mentalidade de menino rico, começando a explorar não somente as partes mais perigosas da cidade, mas também seu próprio lado mais dark, sua raiva, sua dor e o que fazer com ela. A morte dos pais lhe deu mais maturidade que um evento como esse daria para qualquer pessoa, mas um dos trunfos da série (e da ótima atuação de David Mazouz) é torná-lo um garoto maduro florescendo trejeitos da personalidade que farão parte dele como Batman, mas não o tornando um adulto em miniatura.


Além disso, é importante demonstrar o destaque que Thomas Wayne tem para a criação do Batman, afinal, é ele que construiu a Caverna da qual será a Batcaverna no futuro, com o objetivo de limpar a corrupção de sua empresa e quem sabe mais quais outros planos a serem respondidos no futuro. E isso era uma pista todo tempo exposta, seja nas artes e estatuetas de imperadores romanos e generais do exército ao redor da mansão ou de certas qualidade que você vê que foram ensinadas a Bruce pelo seu pai ditas ao longo dos episódios.

6) A lei de Gordon

É compreensivo o certo repúdio que as pessoas tinha a Gordon no início da série. Gordon era o ex-militar de bom coração, que tinha a mulher perfeita e que volta a sua cidade natal, anos depois de ter saído da mesma, para agir como um policial e fazer o bem, como seu pai, o ex Promotor Publico da cidade, outrora fez. Mas como falei anteriormente, os personagens de Gotham começam como estereótipos, e depois vão ganhando dimensão e personalidade a partir que sua relação com as forças que regem a cidade aumentam. Gordon começa a agir de maneira mais aberta a medida do tempo, correndo riscos para salvar o dia, seja em seu todo ou parcialmente. Ele se torna alguém da corporação que é admirado e temido, e a medida que as coisas se complicam, acaba percebendo que lhe restou uma oportunidade pesada demais sobre suas costas, mas que ninguém mais tem forças para carrega-lá. Falcone, do seu jeito, procurava manter a ordem em na cidade, e no fim da temporada, essa responsabilidade é passada a Gordon, que entra até o pescoço em águas mais cinzentas.


7) Mentores e Parceiros

E não poderíamos deixar de citar aqui dois personagens coadjuvantes de enorme importância para que Bruce e Gordon funcionem dentro do show: Alfred Pennyworth e Harvey Bullock. Além de amigos, parceiros, e de certo modo família dos personagens, são dois personagens com forte background e que muitas das vezes roubam a cena brilhantemente. Com o talentoso Donal Logue roubando a cena em pequenos momentos (que acabam se tornando grandes por causa dele até) ou o talento de Sean Pertwee turbinado com a influência do melhor Alfred já feito (do Earth One) trazendo momentos que variam entre ternura e badassary, a interpretação dos dois torna assisti-los tão bom ou até melhor do que os personagens principais. E seja explorando facetas de seu passado ou de sua personalidade, só faz enriquecer ainda mais a experiência de acompanhar o show. além de que a dupla junta em 'Lovecraft' foi sensacional!


8) Fish Mooney, The Ogre e a importância de vilões originais

Nem só de vilões clássicos pode viver a série, especialmente como em sua natureza de origem, não dá para desenvolver alguns personagens em todo seu potencial sendo que para isso precisa-se especialmente de já ter o Batman em ação. A solução para isso foi criar personagens originais, mas como torná-los tão icônicos e fazer o publico querer mais deles com a antecipação, por exemplo, de ver o Coringa da vida no show?

A solução não foram só personagens muito bem escritos e construídos, mas também atores excepcionais lhes dando vida. Fish Mooney é uma animal alpha dentro da máfia de gangster, e em sua busca por poder se ver uma mulher machucada pela vida que nunca mais decidiu abaixar a guarda novamente, além de trazer todo o flamboyant característico dos futuros grandes vilões do Batman.


Apesar de já ter tido outros bat-vilões com essa alcunha, de longe The Ogre mostrado na série é o melhor feito até então, mostrando o lance da dualidade de maneira bem inteligente, além de um vilão psicológico forte e tão eficaz que até corrigiu um dos grandes problemas da série, que era o uso da Barbara Kean no show, pegando a sua irregular evolução e usando isso a favor dela.

9)  Imperador Pinguim e Riddle Man

Há dois grandes destaques da Galeria de Vilões do Batman nesta primeira temporada (além da Selina Kyle, mas ela está mais no campo dos anti-heróis, até mesmo na série), e cada um deles ligado a duas importantes instituições do universo da série: a máfia, representado por Oswald Cobblepot ( O Pinguim), e a policia representado por Edward Nigma (O Charada). Vemos a escalada de Oswald rumo ao topo da cadeia alimentar criminal da cidade, mostrando pelo primeira vez na tela um Pinguim que se assemelha muito mais a sua contraparte nas revistas. Além disso, há um certo elemento de sadismo, não só em suportar todo tipo de dor para chegar aonde quer mas o prazer em infligir dor para o mesmo objetivo. A interpretação de Robin Lord Taylor é uma das coisas mais elogiadas da série, e não é sem motivo.


A também elogiada interpretação de Corey Michael Smith como Edward Nigma mostra também outro lado dos vilões do Batman, que nem todos são malucos e psicóticos por natureza, mas as vezes a ação daquele local, daquela sociedade, fazem despertar o pior nas pessoas. E com Nigma, temos os elementos das HQs  presentes, como o prazer de desafiar as pessoas a fazer charadas e do fato dele ser uma pessoa extremamente inteligente, e a forma que ele raciocina afasta as pessoas ao seu redor. Mas se nas HQs há uma certa relutância clara de Edward em ter essa interação, no show é ao contrário, ele tenta interagir com as pessoas, até arranja um amor platônico, que exatamente ativa seu lado mais violento e psicótico. Ver a queda do Nigma é triste, mas como a ultima cena na temporada bem mostrou, foi um mal que veio para o bem (do publico).

10) Nova Ordem Mundial

Em sua season finale, vemos a guerra das gangues finalmente se tornar explicita, enquanto Gordon procura manter a ordem vigente salvando a vida de Falcone. A guerra explode, há mortes certas (como a de Sal Moroni, para a surpresa de muitos fãs - como eu -) e outras nem tanto (como a de Fish Mooney) trazendo uma nova cara ao crime organizado de Gotham: mais violento, mais louco e mais estilizado. Falcone, consegue se salvar, mas decide se afastar da vida de gangster, deixando nas mãos de James Gordon o papel que era dele, de ser aquele que trará equilíbrio aos lados neste novo cenário, papel este que Gordon é obrigado a aceitar relutantemente. E no fim, na busca por tentar salvar a empresa de seu pai, Bruce Wayne descobre não apenas que seu pai talvez não fosse o exemplo de homem que ele pensasse, já que escondeu de todos a recém descoberta caverna sob a mansão... Que mistérios ela esconde? Só assistindo a próxima temporada para saber.


Veredito

Há muito sobre o que falar desta série que eu infelizmente acabei deixando de fora (Selina Kyle, Falcone e Moroni, Harvey Dent, Montoya Allen, interpretações de outros vilões clássicos) para dar destaque aqueles pontos que realmente são principais para a série na minha opinião. Apesar de muitos virarem a cara para a série devido ao seu tom, acho que não somente ele trabalha de maneira bem inteligente muita coisa da história do personagem, mas além disso traz algo que é audaz: ele não tem vergonha de abraçar TUDO que foi feito antes com o personagem, seja ele bom ou ruim, mas tendo o cuidado de saber aonde usar os elementos. Ele não tem medo de ser exagerado, mas também sabe onde por seu pé na seriedade. Sabe rir de si mesmo, sabe assustar e criar tensão, e  como ninguém sabe deixar seu público, e fãs de longa data, empolgados. É uma jornada que se fez valer a atenção da audiência para aquilo, mesmo que de qualquer modo, por ser Batman, já tivesse seu publico cativo.

NOTA: 9.0