E aconteceu. A DC decidiu ter bolas roxas e trazer a tona, depois de muitos boatos, notícias e confirmações não oficias que sim, o legado que Alan Moore e Dave Gibbons vai estar vivo na nova etapa que a editora está passando, com o anuncio de 'Before Watchmen', uma series de 7 prequels contando histórias que aconteceram em algum momento do passado dentro do clássico oitentista. Ao dessenterrar o "Palavras a 100 p/hora", vou falar sobre o que eu acho do lançamento disto, da reação (já esperada) de Alan Moore e dos leitores em geral,e minha opinião sobre tudo isso e sobre o que as pessoas esperam de quadrinhos de super herói em geral.
Bem, antes de tudo vamos retroceder ao começo de tudo. Sim, a ideia de haver prequels de Watchmen não é uma ideia nova, e muito menos veio de gente querendo grana (mais ou menos falando), primeiramente veio de Alan Moore durante os anos 80, algum tempo depois que a publicação original de Watchmen foi feita.Só que o que aconteceu: Allan Moore queria os direitos da revista de volta, e isso numa época que nem encadernados e nem adaptações para outras mídias era algo tão recorrente quanto hoje em dia.O contrato original dava a Moore e Gibbons uma porcentagens das vendas sobre a mídia impressa, enquanto a DC tinha os direitos sobre a história e personagens, incluindo sua exploração em outras mídias. Nem Moore nem Gibbons queriam um contrato de trabalho, então este trato foi feito,sendo que a regra era se a DC não publicasse Watchmen durante um ano,os direitos voltariam ao escritor.Só que, como o tempo é testemunha, a DC continuou publicando edições de Watchmen nos mais diversos formatos, e após a briga, novamente, sobre os direitos de V de Vingança, da qual foi a razão de Moore cortar as relações de vez com a DC.
No final dos anos 90, dois acontecimentos reacenderam a discussão sobre a revista.Watchmen estava fazendo 15 anos de vida e a DC compra a editora de Jim Lee e um dos tentáculos da Image, Wildstorm, da qual Moore estava trabalhando.Ou contratos de Moore tiveram que se refeitos durante a transferência para a DC, cortando qualquer ligação do escritor com a editora, tendo suas histórias sendo publicadas pelo selo America's Best Comics.Com a volta indireta pra DC, Moore também voltou para ter os direitos de Watchmen de volta, que gerou nos seus 15 anos de vida o cancelamento da linha de Action Figures (que chegou a aparecer em algumas Comic Cons da vida) a fim de manter a relação com escritor mais amenizada.mas o que aconteceu é que Paul Levitz(editor chefe da DC na época) meteu o dedo durante uma das edições de 'A Liga Extraordinária' por causa de uma citação mais explicita a editora concorrente Marvel, além dos processos por causa do filme da Liga Extraordinária, fizeram Moore se desligar de vez da editora e de tudo que tinha feito nela.
Uma das grandes discussões sobre Before Watchmen acabou sendo quem pertence a obra, criativamente falando.Pertence a editora, que pode explorar aquilo do jeito que quiser, pertence ao artista que pode decidir ou não como deve ser explorado aquilo? Bem, se você for considerar o aspecto jurídico da coisa, Watchmen pertence a DC, e ela pode dar direitos de explorar a franquia como quiser, seja filmes, games, bonequinhos ou até mesmo numa sequência. Mas se for pro aspecto criativo da coisa, Moore na verdade não possui o direito completo e absoluto sobre Wacthmen, mas sim faz parte de um legado muito mai velho do que ele, do qual no fim das contas Moore ( e Gibbons) tem um importante, porem pequeno, naquilo tudo que foi construído.
O porquês disso tudo que eu disse no ultimo paragrafo? Porque os quadrinhos de super-heróis, HQs mainstream, seja a forma que for que vocês a chamem,sobrevivem a partir disto, de constante recriação e "reciclagem" e idéias pra que eles mantenham frescas, que façam surgir ideias realmente novas, e principalmente, que mantenha constante o contato com seu publico, e que faça gerar mais publico.Ou seja, o cara que sabe toda a cronologia da DC Pós-Crise de cabeça e pode descrever em detalhes como e quantas vezes a Jean Grey morreu podem ser o sustentáculo de toda a industria, mas pra quem vende é interessante também trazer sangue fresco a piramide da industria.
E agora sendo extremamente pessoal, hoje em dia as pessoas tem uma visão muito errada sobre sobre os chamados "quadrinhos de super herói", porque a maioria das pessoas acusa de só ter lixo envolvido.Na verdade, esse tipo de quadrinho tem uma formula de ser feito, e tem que ser feito desse jeito, para gerar excitação ao ler, escapismo de qualidade.Muitos falam como se nunca tivesse coisas ruins também na década de 70 e 80, e como não tivesse coisas boas nas ultimas duas décadas.Há uma linha tênue que transforma esse formula em algo genial ou algo que acaba descaracterizando o personagem. Se no fim da contas a pessoa segue essa formula, a história será boa ou ruim dependendo de seu talento como storyteller e do que a editora pede.Apoio 100% que deve se ter mais espaço pros quadrinhos independentes,e eles merecem ser lidos, mas tratar aquilo que está enraizado para nós como sendo "quadrinhos básico" como lixo só porque não é o tipo de história que você quer ler e fingir não entender como aquilo funciona, é imaturidade.
E colocando aqui como prova que esse jeito de criar histórias predomina nas HQs, vamos pegar o próprio Alan Moore como exemplo.Ele citou Moby Dick durante sua entrevista sobre 'Before Watchmen' que nunca o escritor original faria uma sequência.Mas isso não significa que não possa haver reinterpretações e reinvenções de se trabalhar com esse personagens, ou outros. Afinal, Liga Extraordinária e Lost Girls não é nada mais que pegar personagens já existentes e criar novas histórias com eles, mesmo esses personagens tendo uma parcela de fãs que não queria que trabalhem nisso da maneira que ele faz.Então, de certo modo, toda a justificativa de Alan Moore vai por água abaixo, já que na prática ele faz aquilo que teoricamente deveria rejeitar.Citanto Peter David, enquanto falava sobre o assunto que estamos comentando: " Só por que uma corporação teve a ideia, ao invés de um único indivíduo, faz com que a ideia seja inferir? É um argumento ruim, considerando o fato de que a corporação quer usar uma propriedade que está em suas mãos." E mesmo assim, varias obras icônicas de várias mídias passam por inúmeros processos de recriação e homenagens por aí, e nem por isso a força do original foi diminuída.Quer um exemplo? Vá procurar no Google imagens da Mona Lisa, tem de imagens engraçadas a artes tão boas, porém de estilo diferentes, da original.Alan Moore ainda é o melhor escritor de literatura vivo, só pegar qualquer coisa que ele escreve hoje em dia e ver, mas em relação a sua situação com a DC, se tropeça em sua própria raiva.
Bem, mas no fim da contas, porque existir Before Watchmen? Primeiro: alguns parágrafos atrás falei sobre que pertencia Watchmen (ou qualquer história) de fato.No fim das contas pertence ao publico.Segundo: voltando aos parágrafos atrás, a industria de quadrinhos se baseia na recriação/reciclagem/reinvenção/reintrodução e velhos conceitos, e de novos, dentro e fora do ambiente de HQ, na tentativa de não somente manter os velhos leitores interessados, mas em especial de atrair novos leitores pra suas trincheiras.Ou seja, se vai sair os prequels do Watchmen, porque haverá uma demanda, seja de leitores velhos ou novos, para isso, assim também como possibilidades de explorar em outras áreas não só na intenção de "atrair mais dinheiro", mas também atrair mais leitores.
Fora da mídia de quadrinhos, Watchmen já teve sua prequel, o game "The End is Nigh", escrito por Lee Wein.E graças ao filme, Watchmen se tornou a graphic novel mai vendida no mercado americano por mais de 1 ano, desde o surgimento de seu teaser trailer até um tempo após do lançamento do filme.E apesar do filme não ter passado na faixa de 200 milhões em bilheterias (afinal ele foi um blokbuster de verão com faixa etária18 anos, algo completamente atípico nesses dia), fez sucesso entre o publico e teve bons números em home video.
Bem, esse texto foi escrito por mim afim de mostrar que, comercialmente falando, os prequels eram inevitáveis.Como muitos podem interpretar errado aqui, não estou falando que 'Before Watchmen' será bom, mas que merece o benefício da duvida, mesmo que tenho certeza que muito vão olhar e resenhar já com ódio pré estabelecido essas HQs.Pessoalmente, apesar das inevitáveis ligações com a obra original, acho deve funcionar de maneira mais independente, seja para velhos e novos leitores, ou seja, as conexões só vão existir se você quiser que elas existam.Quando ela sair no meio do ano saberemos realmente o que esperar disso tudo.Novamente citando Peter David: "Pra mim, o anúncio da DC simplesmente significa que o trabalho de Alan Moore alcançou o status de “icônico”, tanto quanto Superman e o Monstro do Pântano".
Watchmen ainda é uma obra relevante, e merece ser respeitada, mas para nenhuma obra de arte faz bem ser "canonizada". É só pegar Superman por exemplo. Mas mesmo assim, pelo fato que vão fazer outras coisas com o "canône", não significa que ele vai ser destruído de vez.The Dark Knight Strikes again não fez todos nunca mais lerem The Dark Knight Returns.O tempo vai ser o grande juiz acerca de Before Watchmen, mais que a mídia especializada, mais que os fãs.Porque o que é canônico é feito para durar, seja lá o que o atinja.E acho que esse vai sr o grande desafio, além de enfrentar "A Igreja" de fãs.Se for mexer com algo no passado e trazer de volta anosos dias, ele tem que ser relevante para quem assiste na época.Eu acho que o filme fez isso sem se distanciar muito do fato que é baseado em algo escrito na década de 80, e as equipes criativas de BW sabem que essa é a chave para fazer Watchmen funcionar, de novo. Ela não tem que ser uma referenciação do que foi feito antes, mas tem que se mostrar tão importante dela existir hoje em dia quanto o primeiro existiu lá nos anos 80.
Pra acabar a matéria, digo que estamos numa revolução.O resultado de tudo isso pode ser enterrado com o tempo,caso for ruim, ou se perpetuar e permanecer como algo tão bom quanto o original.Ou o mais provável, que, assim como o filme, ele precise de tempo para entender o que foi feito.Mas pra mim, o que interessa não é o que acontece por detrás da cortina, mas se a historia será boa e relevante nesses dias. Isso vai acontecer e será inevitável, e pelo menos fará a tentativa de ser bom (diferente de DK2, que foi quando começamos a perceber que Frank Miler estava louco). Deixo abaixo algumas frase da equipe criativa para reflexão:
Lee Bermejo: O mais importante é que tudo esteja reunido para nós contarmos as melhores histórias possíveis e reconectar esses personagens.Já se passaram 25 anos, vamos fazer isso ser vital de novo.
Dave Gibbons: A serie original de Watchmen era algo que eu e Gibbons queríamos fazer.Entretanto, eu entendo e apoio a inciativa da DC de fazer essa homenagem ao nosso trabalho, e desejo sorte a equipes criativas envolvidas>talvez essas novas revistas tenham o sucesso desejado.
Zack Snyder: Para os fãs de quadrinhos, é uma obra de arte, que definiu com que se pode fazer com os quadrinhos, se você quiser voltar atrás para isso, terá de fazer por sua conta e risco.Voltar a trabalhar com isso (Watchmen) seria algo duro de se fazer, e o desafia é acrescentar algo que seja certo aquilo feito, ou senão as pessoas vão a loucura.
Darwin Cooke: Eu disse não de cara na primeira vez que me chamaram, porque não pensaria em criar qualquer história que destruiria o que o original construiu, e francamente isso iria acontecer naquela altura do campeonato. Além disso, isso atrairia uma certa atenção da qual eu não gostaria.Mas o que aconteceu é que, meses depois do meu "não" ser dito, é que uma história veio a minha cabeça e pareceu funcionar foi ai que fiquei empolgado em fazer a história de fato.
Brian Azzarelo: A reação instintiva ao projeto é 'por quê?'. Mas quando as séries saírem mesmo, a resposta vai ser: 'Ah, por isso.'
John Higgins: O desafio é fazer estas histórias serem moderna e relevantes para 2012 e o que pode ser feito com respeito e consideração como material original que vem influenciado tantas pessoas durante esses anos, mas adicionando algo a isso, não depreciando.
J. Michael Straczynski: A questão é: "Por que fazer qualquer coisa com base em algo que foi bem feito?" É estranhamente contra-intuitiva: os personagens são ótimos, o mundo é fantástico, nós criamos algo maravilhoso aqui, por isso, Deus - vamos nunca faça isso de novo. Fuja!
Um monte de gente acha que esses personagens não devem ser tocados por qualquer outra pessoa a não ser Alan, e enquanto isso é absolutamente compreensível em um nível emocional, é profundamente falho em um nível lógico. Baseado em durabilidade e reconhecimento, então eu poderia fazer o argumento de que Superman é o maior personagem de quadrinhos já criados. Mas nem Alan nem ninguém jamais sugeriu que ninguém além de Shuster e Siegel deve escrever Superman. Alan aceitou escrever Monstro do Pântano, um personagem de quadrinhos criado por Len Wein, e fez um ótimo trabalho. Ele não disse "Não, não, eu não posso, que é personagem de Len". Nem deve ter.
Mais uma vez: em um nível emocional, eu entendo. Mas por isso mesmo, Alan passou a maior parte da última década a escrever algumas histórias muito, muito boas sobre personagens criados por outros escritores, incluindo Alice (do País das Maravilhas), Dorothy (de Oz), Wendy (de Peter Pan), bem como o Capitão Nemo, o Homem Invisível, Jekyll e Hyde e Professor Moriarty. Eu acho que se perde um pouco de moral,já que ele diz: "Sou capaz de escrever personagens criados por Jules Verne, HG Wells, Robert Louis Stevenson, Arthur Conan Doyle e Baum Frank, mas é errado para qualquer outra pessoa para escrever um dos meus personagens."
A falta de sua bênção tem nenhum impacto mais sobre o processo atual de contar histórias do que seria o caso se tivéssemos as suas bênçãos. A história tem que sustentar em seu próprio eixo. Uma história de baixa qualidade não seria ajudado por ter suas bênçãos, e uma boa história não se torna melhor por isso. Seria legal? Claro. Eu adoraria. Mais uma vez, sempre fui um grande fã do trabalho de Alan. Voltando no tempo, quando eu trabalhava no "The New Twilight Zone", eu o segui e, depois de fazer o impossível para encontra-lo, conseguiu conversar com ele no telefone para perguntar se ele por favor considere escrever um episódio pra série. (Ele disse que não.) Alan é o melhor de nós. Eu já disse várias vezes, online e em convenções, que em uma escala de 1-10, Alan é um 10 explodindo. Eu não só disse que, mais importante, eu sempre acreditei nisso.
Por hoje acabou, até a próxima!