quinta-feira, 6 de agosto de 2015

Review: Fantastic Four (2015)


A Primeira Família da Marvel não teve muita sorte nos cinemas desde cedo. No incio dos anos 90, o lendário produtor Roger Corman fez um filme com os personagens que nunca chegou a ser lançado, até alcançar status de cult graças as as cópias piratas circulando pelo vídeo e posteriormente pela internet. Depois veio os dois filmes de Tim Story, o primeiro um gigante comercial de TV que servia para ser o contraponto cômico em relação a seriedade que os X-men traziam, que resultou num filme bastante falho, mas que entreteve o publico. Já sua sequencia, mesmo com o criticado Galactus-nuvem, foi uma sequência anos-luz superior  ao seu antecessor, mas que não gerou o sucesso suficiente para seguir em frente. Com a Fox segurando suas franquias mais valiosas, teve como resposta o boicote vergonhoso por parte da Marvel, atingindo aquilo que o estúdio de cinema não pode tocar (quadrinhos e licenciados). Com a casa dos X-men arrumada com DOFP, o que falta era por a Primeira Família alinhada novamente. Eles conseguiram isso? Continue abaixo, pode conter SPOILERS.


Vamos começar pelo começo: Ben Grimm (Jamie Bell) fica amigo de Reed Richards (Miles Teller) ainda na adolescência, quando ele tenta criar uma maquina de teletransporte, o que acaba sendo sucedido e melhorado com o tempo. Ao entrar na vida adulta, ele é chamado pelo Doutor Franklin Storm (Reg E. Cathey), em companhia de sua filha adotiva Sue Storm (Kate Mara), a se juntar a uma equipe formada pelo rebelde de bom coração Johnny Storm (Michael B. Jordan) e o egocêntrico gênio Victor Von Doom (Toby Kebbell) a tornar seu projeto realidade. A Maquina de Teleporte já planejado durante anos no complexo cientifico do Edifício Baxter, porém sem as ideias projetadas por Reed para fazer dar certo. Após um teste bem sucedido, uma viagem precipitada seguida por um catastrófico acidente dá a Reed, Sue, Johnny e Ben poderes que são vistos a principio por eles como uma maldição, mas pelo exército como algo a ser explorado militarmente no futuro. Mas preso no Planeta Zero (conhecido pelos fãs como a Zona Negativa), Doom sobrevive e fica mais poderoso ao se conectar com a fonte de energia do planeta, apenas esperando o momento certo de aplicar sua vingança contra todos...


Dirigido por Josh Trank (de Chronicle) o filme em sua escala é maior, e apesar de ter em comum o tema de amadurecimento e crescimento, é maior em escala, mas não é sua típica adaptação blockbuster. Pelo contrário, o filme é 100% guiado pelos personagens e suas emoções, mostrando muito bem o conflito interno e em relação aos outros que sofrem por estarem presos a condições tão únicas como as deles. Além disso, com tantos filmes que procuram sempre "salvar a Terra de uma catástrofe" feitos de maneiras boas, ruins, e com formulas repetidas a esmo (vide Marvel Studios) em todo filme, é legal ver, como aconteceu em Homem-Formiga, algo menor, mais intimista, da qual o conflito é realmente gerado pelas relações entre os personagens, novamente algo que o diretor aplicou em Chronicle.

E com isso temos um resultado realmente satisfatório, mostrando uma jornada de começo, meio e fim, e como a sede de descoberta de um rapaz consegue mudar a vida das pessoas, e a si própria, e como cientista, as causas boas e ruins que essa jornada pode levar. E isso nos leva a outro fator bastante positivo dentro do filme: uma ciência que fascina de fato, que traz a sensação de empolgação das descobertas. Vemos cientistas jovens com real vontade de mudar o mundo pra melhor, alimentados pela filosofia de alguém ,no caso Franklin Storm, que tentou mudar o mundo melhor pela ciência e falhou. E isso interfere diretamente nas relações pessoais deles, com o Instituto Baxter e especialmente com o exército/governo, que por influência das versões Ultimate (e de 'The First Family') tem papel importante na trama do filme.


E destaque mais do que especial pros personagens do filme, com suas personalidades tiradas diretamente das revistas e muito bem adaptadas pro universo do filme. Reed Richards tem o bom coração e o cérebro genial que o fazem conquistar o direito de líder da equipe, além da solida relação que ele mantém com Ben Grimm e do remorso que sente ao ver que, por um momento, seus planos de usar seu intelecto para mudar a vida das pessoas ocasionou em uma tragédia. Ben Grimm é o "músculo" da equipe, e sua amizade com Reed é um dos principais alicerces do filme.


 A transformação e sequente fuga de Reed, para não ser mais uma cobaia e descobrir a cura sem colocar mais ninguém em perigo, obviamente cria conflito com Ben, que deixado para trás por seu melhor amigo, acaba utilizando a força para enterrar a raiva e a dor da transformação, e será interessante ver isso explorado numa sequencia como o fato de agir como um herói pode fazer para ele se sentir redimido de ser apenas uma arma do governo.


E chegando aos irmãos Storm, as maiores mudanças nem ficam com Johnny Storm (do qual o fato de ser interpretado por um homem negro gerou, e ainda gera, desnecessárias e estúpidas discussões), que está bem fiel aos quadrinhos em termos de personalidade, e anos-luz superior a atuação do Chris Evans. Mas as grandes surpresas moram em Sue Storm, especialista em descobrir padrões, e que de certo modo sua visão analítica das coisas as vezes tanto ajuda quanto atrapalha em seu relacionamento com os demais. Além disso, ela é adotada e nascida em Kosovo (Servia), o que pelo histórico de guerras do local faz sua visão sobre os militares não ser necessariamente a melhor...


E isso traz um fator interessante da trama, e que entra em conflito diretamente com sua irmã adotiva. Ela sabe que está sendo mantida ali para fins militares, só que ao mesmo tempo que ela procura se afastar de ser usada como uma arma, controlando seus poderes enquanto busca a cura para os mesmos. Já Johnny vê nisso um potencial a ser preenchido, já que vê no incidente algo que foi dado a ele pelo destino, não mandado pelo seu pai ou por mais ninguém, e que ele deve aproveitar isso para retribuir as pessoas de volta.


Mas meu destaque aqui vai para o Victor Von Doom de Toby Kebbell, que finalmente trouxe justiça ao personagem nas telonas como a melhor interpretação do Doctor Doom até então. Temos ali forte o ego do personagem, que sempre foi o combustível para as ações do personagem, a genialidade, a inveja de Reed Richards, o remorso e ódio de não conseguir ser salvo, a soberba, o nacionalismo forte... Está tudo ali, completo e adequado ao que o personagem do filme pedia. E vai ser interessante (se conseguirem uma explicação lógica pro personagem voltar) ver como vai ser as aplicações dele tomando a Latveria para si (até a bandeira é igual a dos quadrinhos), já que ele é extremamente anti-governo e não exatamente acata ordens daquilo que seriam seus superiores bem... E as inspirações de 'Akira' e 'Scanners' foram brilhantemente utilizadas durante a cena do corredor.


E não dá pra falar de Dr Doom sem citar a Zona Negativa (ou como é chamada no filme, Planet Zero), que por sí so é uma personagem no filme, assim como um poderoso instrumento. Um planeta do qual fonte de poder é consciente, e que se adapta as vontade de quem entra em contato com ela. isso é importante pois a questão de poder é algo recorrente no filme: o poder que você recebe e o que fazer com ele te define como herói e vilão (que é um tema recorrente em todos os personagens da Marvel: 'poder e responsabilidade' não é um mantra dito de graça). Mas graças a essa conexão mais profunda entre Doom e 'Zero' que não só lhe dá energia mais o alimenta, a ponto de ele ficar tão poderoso que terraformou o planeta (informação no esquema 'show, dont tell' - a ser discutido adiante-) e de que lá ele é (quase) imbatível.


O ponto fraco do filme pode ser citado em que certos momentos não duram tanto quanto deveria, sendo que há uma diferença aí entre ser corrido e não ser aproveitado. O filme consegue passar muita informação com pouco, mas há momentos que você sente que a conversa poderia ter sido mais longa e que o desenvolvimento da trama tinha a ganhar com isso, especialmente no terceiro ato. Mas, como disse, a mensagem foi muito bem enviada, o esquema 'show, dont tell' funciona muito bem neste caso. Eu particularmente tinha esperanças de Harvey Elder (O Toupeira), interpretado por Tim Blake Nelson, voltar numa sequência, por mais que tenha feito seu papel bem ali, não deu (e nem dará) indicações que vai assumir a sua contraparte dos quadrinhos.


Mas no fim, como definir 'Quarteto Fantástico'? Diferente. Mas péssimo, como a maioria da critica indica? De forma alguma. Nem de longe seus defeitos atrapalham a experiência de ver o filme e se divertir com o filme. mas a grande questão é, como disse anteriormente, ele não é sua tipica adaptação blockbuster. E isso é ótimo, precisamos de mais coisas assim.o resultado no terceiro ato pode ter pecado, mas ainda sim vemos uma história de amizade muito bem contada e construída. É tudo basicamente sobre jovens tentando mudar o mundo e no processo encontram a si mesmos, e isso foi fechado sem forçação de barra entre os personagens, como forças a Sue e Reed agirem como um casal ou forçar os quatro a agirem como uma família. E vai valer MUITO a pena ver isso se concretizar em uma ou mais sequencias.

O caso do Quarteto Fantástico não pode acabar como acabou 'Amazing Spider-Man', pois o que a gente viu ali é a construção de um mundo deles muito melhor planejada e executada que o caso da Sony. mas infelizmente, não tem como negar que o fantasma da Marvel Studios está sondando a equipe, com apoio de uma crítica tendenciosa e fãs acéfalos que se importam mais em todo mundo estar junto deixando para trás a qualidade e a relevância que esses filmes podem e merecem ter. E assim, infelizmente a melhor e mais fiel adaptação do Quarteto Fantástico acabou tristemente tendo a mais injusta avaliação dos últimos anos para filmes do gênero, e com a Geração Internet impedindo que os filmes sofram a ação do tempo e consequentemente sejam vistos com melhores olhos. Mas mesmo com o desabafo de um fã cansado, ainda estou bem feliz com o resultado, porém preocupado, com que pode acontecer com a Primeira Família. pois mais assustador que a equipe nas mãos do Roger Corman, é a equipe nas mãos da Marvel Studios. E eu estou falando muito serio sobre.

NOTA: 8.0

PS 1: Pelo segundo ano consecutivo, a Fox trouxe os melhores filmes da Marvel do ano, com Quarteto Fantástico, e aquele que de fato é o melhor filme da editora do ano, que é 'Kingsman'. E isso é uma tendência que só tem a aumentar nos próximos anos.

PS 2: Leiam minhas 5 recomendações de leitura em relação ao filme (que justifica bastante os porquês de eu ter gostado do mesmo) aqui.